quinta-feira, 26 de maio de 2011

As Minhas Fugas das Prisões de Veneza por Giacomo Casanova: Excertos

“… é uma solidão que desespera; mas só se pode sabê-lo depois de se passar pela experiência. A partir de então compreendi como se enganam aqueles que atribuem ao espírito do homem uma certa força: tal força é apenas relativa e o homem que a si mesmo se estudasse com rigor encontraria em si somente debilidade. Compreendi que, embora só raramente aconteça que o homem atinja a loucura, é contudo verdade que tal coisa não é difícil. O nosso juízo é como a pólvora, que sendo embora fácil de inflamar só se inflama quando se lhe pega o fogo; ou como um copo que nunca se partirá a não ser que o partam.”

“ Um homem que dorme tranquilamente na prisão, não está na prisão durante o seu doce sono, e o escravo enquanto dorme não sabe que o é, tal como os reis enquanto dormem não governam. Há-de portanto considerar aquele que o acorda como um carrasco que vem privá-lo da sua liberdade e mergulhá-lo de novo na miséria. Acrescente-se que vulgarmente o prisioneiro que dorme sonha que está em liberdade e que essa ilusão lhe faz as vezes da realidade.”

“ Os espíritos fortes que dizem que a oração não serve para coisa nenhuma, não sabem o que dizem: sei que depois de rezar a Deus me achava sempre com mais força. Mais não é preciso para reconhecer a utilidade da oração. Há quem pretenda que esse aumento de força é um efeito natural da matéria tornada mais vigorosa pela confiança que ela obteve por via da oração, e que tal acontece sem que Deus tome parte no processo. Respondo que, uma vez que se admite Deus, Deus toma parte em todas as coisas. Os que têm uma religião dispõem de muitos recursos que os incrédulos não têm. Os primeiros compreendem pouco do que se passa, mas os segundos não compreendem absolutamente nada.”

“… a verdade está escondida num poço, mas quando lhe vem o capricho de se mostrar, toda a gente fica surpreendida e fixa sobre ela os olhares, porque surge completamente nua, é mulher e é bela.”

“O homem erra ao atribuir a si mesmo mérito por aquilo que fez de bom e erra duplamente ao caluniar a fortuna pondo na conta dela os males que lhe acontecem. A minha história mostrará que tomos somos imbecis quando procuramos longe de nós as causas de tudo o que de sinistro nos acontece: directa ou indirectamente, encontrá-las-emos todos em nós mesmos.”

“O maior alívio que pode ter um homem atormentado é sentir a esperança de em breve sair do tormento. Contempla o feliz instante em que verá o fim da sua desgraça; persuade-se de que tal instante não demorará muito a vir e seria capaz de tudo fazer para saber a hora precisa em que esse instante chegará. Mas não há ninguém que possa saber em que instante se dará um facto que depende da vontade de um outro, a menos que lho haja dito esse outro. Porém, o homem que se tornou impaciente e cujas forças se foram esgotando acaba por acreditar que é possível, por algum meio oculto, descobrir o dito momento. Deus, diz ele, tem que saber quando chegará esse momento, e Deus pode permitir que a hora desse instante me seja revelada por um sortilégio. Logo, que o curioso faz este raciocínio, não hesita em consultar a fortuna, disposto ou não a julgar infalível tudo o que esta possa dizer-lhe.”

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